30 de julho de 2010

Contagem regressiva


Minha família e eu estamos passando por um momento dificílimo: a vida sendo retirada em conta gotas. E a sensação de impotência cresce a cada minuto.
Comecei este blog com alguns posts sobre minha tia Ludmila, ou simplesmente Mila. O estado de saúde dela, até então, era complicado: estava com o estômago obstruído por um tumor, por isso não comia. Duas cirurgias foram feitas para tentar fazer com que ela se alimentasse e pudesse ganhar força para iniciar o processo de quimioterapia.
Mas ontem, 29.07.10, na terceira cirurgia, foram usados todos os conhecimentos médicos para reverter um caso gravíssimo. Resultado: a Medicina lavou as mãos. Abriram-na e não puderam fazer nada. Agora só o tempo, que não sabemos se um, dois dias ou uma semana para o sofrimento acabar. Estamos assistindo o fim de uma vida.
Nossa família, dividida em quatro cidades (Campinas – o centro de tudo isso – Ribeirão Preto, Sertãozinho e Londrina) está arrasada. Todas as estruturas emocionais estão rasgadas por um sentimento de perda (e aí inclui uma preparação interna para o luto), mas, ao mesmo tempo, ainda convivemos com quem vamos perder.
Não dá para entender ou explicar direito o que se passa em nossa cabeça. Estamos à espera da morte! Uma morte que, para mim, significará o fim do sofrimento, um descanso para ela e para nós. Claro que vamos perder um ente queridíssimo, mas eu sinto que esta pessoa já se foi há muito tempo, porque a personalidade de minha tia Mila eu não consegui encontrar em nenhuma das vezes que fui visitá-la.
Eu fico pensando como está sendo o dia de hoje para o pessoal de Campinas, porque claro que eles vão visitá-la. Mas como será essa visita? Até ontem os encontros, apesar de todo o quadro, ainda nutria uma esperança. E agora: o que dizer, como reagir, contar para ela o que se passará a partir de agora? Como chegar perto de uma pessoa, dar carinho, atenção, acalentar a dor sabendo que a qualquer momento (seja por causa da fraqueza ou dor câncer) ela pode desfalecer? Ainda se ela estivesse sedada... acho que seria menos complicado. Porém ela está acordada, até onde sei só ligada a uma máquina que a alimenta, então, pode conversar (apesar de que isso, uma das características mais marcantes, não se encontra mais no corpo que conhecemos como sendo a tia Mila, mas, como já disse, não é mais dela ou pelo menos não se encontra mais os sinais de sua personalidade).
É um desabafo. Desculpe-me você que está lendo este texto. Isso aqui sou eu conversando comigo mesmo, tentando encaixar os pensamentos, uma preparação para um momento de dor (porque todo o ser humano é materialista, egoísta e não aceita perder o físico das pessoas queridas), mas uma dor que abre um caminho para o descanso tanto dela quanto de todos nós.
Faz dois dias que já me despeço de minha tia Mila em oração. Já agradeci a Deus por ter colocado-a em meu caminho, de ter podido conviver com uma pessoa bem humorada, que adorava conversar, com quem tempo ruim não existia. Também já pedi para que Nossa Senhora leve-a depressa e que ela possa encontrar no outro plano meu padrinho (marido dela morto em 2004, vítima do coração, complicação da diabetes. Uma morte rápida. Uma perda estúpida) e meu avô materno (um homem abençoado, morto em 2002, por insuficiência de órgãos depois de vários meses em que não dormia e em que não o reconhecíamos) e que eles possam acalentá-la, ajudá-la a entender tudo e a descansar para tornar-se, como eles, um guia para todos nós aqui embaixo.
Eram 20:30 de ontem (29.07.10) quando recebemos a ligação de meu tio Edward dizendo: “Olha, a Medicina fez tudo o que podia. Abriram-na e não fizeram nada. Agora é questão de tempo. Daqui umas três horas a anestesia acaba. Vamos ver o que acontecerá”. Depois disso, um silêncio apertado, sofrido, baixou em casa. Ligamos para Londrina e Ribeirão e o silêncio dividiu-se para estas cidades, mas continuou pesado. Cada um de nós em casa tentamos ficar acordados até 23:30 (quando se acabava o tal prazo da anestesia) para ver se recebíamos alguma notícia: não recebemos. Isso significa que ela ainda está viva. Para mim, não é uma boa notícia. E a espera torna-se, a cada minuto, uma tempestade de tristeza, de perda, de adeus.

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